10.01.2005

Seriam as cebolas até mais belas que as rosas?

Fotografia: Gwynstock
Ode à Cebola
Pablo Neruda

Cebola Luminosa
redoma
pétala a pétala
cresceu a tua formosura
escamas de cristal
te acrescentara-me
no segredo da terra escuras
e foi arredondando
o teu ventre de orvalho.
Sob a terra foi o milagre
e quando apareceu
o teu rude caule verde
e nasceram as tuas folhas
como espadas na horta,
a terra acumulou o seu poderio
mostrando a tua nua transparência,
e como em Afrodite o mar remoto
duplicou a magnólia levantando os seus seios,
a terra assim te fez cebola
clara
como um planeta a reluzir,
constelação constante,
redonda rosa de água,
sobre a mesa das gentes pobres.
Generosa
desfazes o teu globo de frescura
na consumação fervente da frigideira
e os estilhaços de cristal
no calor inflamado do azeite
transformam-se em frisa
das plumas de ouro.
Também recordarei como fecunda
a tua influência, o amor, na salada
e parece que o céu
contribuidando-te fina forma de granizo
a celebrar a tua claridade picada
sobre os hemisférios de um tomate.
Mas ao alcance das mãos do povo
regada com azeite
polvilhada com um pouco de sal,
matas a fome
do jornaleiro no seu duro caminho.
Estrela dos pobres,
fada madrinha
envolvida em delicado
papel,
sais do chão
eterna, intacta, pura
como semente de um astro
e ao cortar-te
a faca na cozinha
sobe a única
lágrima sem pena.
Fizeste-nos chorar sem nos afligir.
Eu tudo o que existe celebrei, cebola
Mas para mim és
mais formosa que uma ave
de penas radiosas
és para os meus olhos
globo celeste, taça de platina
baile imóvel
de nívea anémona
e vive a fragância da Terra
na tua natureza cristalina.